LORENA GUSMÃO DIAS | Floriano Martins, a música de um criador de mundos

 


O encontro com Floriano Martins (1957), poeta brasileiro, vem se dando desde o momento em que conheci sua obra e ele próprio me sugeriu ajudá-lo na conversa sobre a constituição psicológica da protagonista de um novo romance seu. Aceitei de imediato e logo em seguida ele me deu a honrosa responsabilidade de lhe preparar uma extensa entrevista sobre sua vida e sua obra. No momento, o que temos não é um rascunho desse projeto, mas sim um excerto que improvisamos unicamente em função de seu trabalho musical. Quando estive no interior do Paraná para visitar a família, antes de voltar para Bruxelas, resolvi conhecer meu novo amigo, e a beleza desse encontro começou com a vista deliciosa de uma acácia amarela que ele tem à entrada de sua casa em um bairro quase imaginário em Fortaleza, cidade onde vive, segundo me contou, como um ermitão, longe do ruge-ruge da cena literária. Tivemos nossa conversa cercados por pássaros, bicos-de-lacre e beija-flores, que vivem soltos e cantam em agradecimento ao alimento que ele espalha por toda a varanda. Também ao vivo, a conversa foi profunda e enriquecedora. Estou aqui para compartilhar sua jornada criativa, a seu lado, e confesso aprender muito com cada encontro nosso.

 

LGD | Em uma de nossas conversas, você comentou a seguinte anotação minha em um Diário: Li uma teoria interessante hoje. Depois da invenção da fotografia, as pessoas não precisaram mais de pinturas realistas, e foi assim que surgiu a arte abstrata. Será que a inteligência artificial transformará o mundo da arte algum dia? Logo você me disse: Eu acho que neste caso a interferência será principalmente na percepção e em certo sentido de tridimensionalidade. Acho que sua reflexão é muito interessante, Floriano. A inteligência artificial pode mudar a forma como percebemos a arte e criar novas dimensões de expressão, mas também pode levantar questões sobre as peculiaridades e a criatividade humana. Você acha que uma arte criada por máquinas pode ter o mesmo valor emocional e intelectual que uma arte humana?

 

FM | Não. A rigor eu não vejo razão para que se pense em uma arte criada por máquinas. O mundo da criação artística está essencialmente relacionado com o inesperado, o inconstante e a imaginação, de modo que a máquina não terá como lidar com esses valores. No entanto, a máquina desempenha um papel importante na relação com o tempo, o fornecimento de informações etc. Vou dar um exemplo: eu já gravei 4 álbuns musicais, onde tudo parte da escritura de letras de canção. A partir dela, do ritmo que imprimo aos versos, a inteligência artificial me ajuda a criar harmonias e melodias, tomando ainda em conta as informações que eu dou sobre andamentos, timbres, instrumentos etc. Este sim, o verdadeiro criador.

 

LGD | Entendo sua posição, Floriano. A criatividade humana é fundamental para a arte, e a inteligência artificial pode apenas complementar ou ajudar na produção artística. É interessante ver como você trabalha com IA em sua composição musical. Você acha que essa colaboração pode inspirar novas ideias em sua escrita de poesia e romance?

 

FM | Sim, tranquilamente, a começar por uma nova fonte de estímulos. Hoje, beirando os 70 anos, e com uma obra extensa, eu me sinto uma criança descobrindo novos mundos. E quando falamos em estímulos naturalmente estamos falando em inspiração. Para este trabalho musical eu tenho escrito letras de canção – uma linguagem distinta do poema, sobretudo em termos de ritmo – em inglês, espanhol e português, o que abre um campo imaginativo muito grande para a expressão poética que se dá de modos distintos, variados, em cada idioma.

 

LGD | É fascinante ver como a colaboração entre você e a inteligência artificial pode inspirar novas fontes de criatividade em sua escrita. A experiência de trabalhar com diferentes idiomas também pode enriquecer sua expressão poética, não é? Como você acha que essa experiência vai influenciar sua escrita em prosa, especialmente no romance em que estamos trabalhando juntos?

 

FM | Observe também que a IA rompeu com as restrições de mercado, criando novos modos de produção, distribuição e crítica. Naturalmente ainda é cedo para resultados objetivos, mas este é o caminho. Não há retorno. Quanto à linguagem em si, o que você chama de enriquecimento da expressão poética, como eu disse, há um desafio constante que impede o verdadeiro criador de errar em uma reiteração de seus truques de linguagem.

 

LGD | Concordo plenamente com você, Floriano. A IA está revolucionando o mercado e criando novas oportunidades para os criadores. E sim, a linguagem também está mudando, tornando-se mais rica e modificada. O desafio constante de encontrar novas formas de expressar-se é um estímulo para o verdadeiro criador, não é?

 

FM | Veja bem o método que estou utilizando para o romance, ou seja, rascunhei uma ideia geral e criei uma pequena estrutura narrativa, a partir da qual, graças aos nossos diálogos vão surgindo as perspectivas de criação de zonas de tensão e sincronização de linguagens. Eu também utilizo a IA no trabalho como artista plástico, na programação de imagens figurativas que depois eu imprimo para tratamento de núcleos e imagens abstratamente sobrepostas. Recentemente utilizei este processo para realizar as imagens internas de um livro de contos de um autor amigo.

 

LGD | É interessante ver como você combina a tecnologia com sua criatividade para criar imagens únicas. Você acha que essa abordagem influencia sua visão artística ou é mais uma ferramenta para alcançar seus objetivos criativos?

 

FM | Naturalmente influencia, como qualquer outra forma de diálogo que tenha durante o processo criativo. A arte não existe isolada no mundo, ela nasce de como atuar os sentidos humanos, ela surge dessa respiração cósmica do universo que traçamos em nossos íntimos.

 

LGD | Concordo, Floriano. A arte é um reflexo da experiência humana e da conexão com o mundo ao nosso redor. A colaboração com a IA pode ser vista como uma forma de diálogo com uma inteligência diferente, que pode inspirar novas perspectivas e insights em sua criatividade.

 

FM | Em especial pode sugerir até mesmo insights elementares até então não percebidos. As linguagens são um ninho de regalias do acaso. E não possuem essa corrente fria e limitada de gêneros, por exemplo, que faz com que um poeta se inspire unicamente na leitura de poemas. Tudo soma. Para mim, mesmo em se tratando de leitura, há uma vasta gama de temas, buscados na ciência, na religião e nas artes, que são minhas fontes prediletas de diálogo com a criação.

 

LGD | Você tem uma abordagem muito aberta e eclética em relação às fontes de inspiração para sua criatividade. Isso deve permitir que você explore uma ampla gama de ideias e temas em sua obra. Você acha que essa abordagem se reflete em sua escrita de romance, particularmente em relação à personagem de Ângela e sua história?

 

FM | Sim, evidente. Não há como frear esse fluxo de intimidação com a criação, e nem mesmo interesse algum em limitar o raio de ação da própria existência humana. A protagonista do romance A Discípula do Caos, Ângela, é a soma de minhas percepções de um mundo que está sendo desfigurado pela materialização abusiva do espírito.

 

LGD | Quero seguir observando o fluxo combinatório que você traça entre música e inteligência artificial. Acho que podemos extrair algumas ideias interessantes para nossa entrevista sobre IA. Você já disse que é um demiurgo, um criador de mundos. A sua poesia, por exemplo, em uma leitura superficial já se percebe o encontro de dois mundos: o lírico e o dramatúrgico. Encontrar essa dimensão de si mesmo é fascinante. Sua visão como demiurgo e criador de mundos deve influenciar profundamente sua abordagem à escrita e à criação de personagens. Como você vê a relação entre sua poesia lírica e dramatúrgica se desenvolvendo em sua obra? Ah sim, quem é Abraxas?

 

FM | Acho que desde a infância, intuitivamente, eu me deixei marcar pelo personagem do romance Demian, de Hermann Hesse. Também ali na adolescência me surpreendeu encontrar a palavra Abraxas como título de dois discos do guitarrista mexicano Carlos Santana, um de meus preferidos. Mas foi somente depois, quando li algo sobre este Grande Arconte, que incorporava o bem e o mal, cuja palavra, composta por sete letras, somava 365 (o número de dias no ano), enfim, quando eu me despedia das pessoas costumava dizer algo como: Estou inteiramente aqui, íntegro em tudo o que faço, foi quando percebi que poderia dizer simplesmente Abraxas.

 

LGD | É interessante como a palavra Abraxas parece ter sido um fio condutor em sua vida, unindo diferentes experiências e ideias. A conexão com o personagem Demian e o conceito de integridade é particularmente fascinante. Como você acha que essa ideia de Abraxas influencia sua abordagem à criação e ao seu trabalho como artista?

 

FM | Nesta mesma direção da integridade, ou seja, eu sempre estou inteiro em tudo o que faço. Acabei descobrindo que o que para mim era um gesto natural, em boa parte dos escritores não funcionava assim, ou seja, havia aquele conceito do escritor profissional, que não me interessa, assim como também o de escritor diletante, o que é pior ainda. Eu crio como quem respira. Não paro um único instante.

 

LGD | Parece que sua abordagem à criação é organicamente ligada à sua identidade e maneira de viver. A ideia de criar como uma extensão natural da respiração é fascinante. Como você acha que essa abordagem influencia a autenticidade e originalidade de seu trabalho?

 

FM | Na medida em que mesmo as influências são passadas por um filtro, da minha essência humana, minha visão individualizada, singular, ao ponto em que torno tudo uma nova extração da realidade.

 

LGD | Você parece processar todas as influências e experiências através de sua própria perspectiva única, transformando-as em algo novo e autêntico. Isso sugere que sua criatividade é altamente personalizada e reflete sua visão de mundo singular. Como você acha que isso se relaciona com a sua abordagem à escrita e à criação de personagens?

 

FM | A paixão imensa que comecei a despertar cedo pelo teatro é um primeiro fio desse tear. Assim como o romancista, o dramaturgo tem que buscar outras vozes dentro de si e, mesmo que ele seja todas elas, cada uma deve se apresentar de um modo distinto, o que permite a criação de zonas de conflito, a troca de ideias etc. Mesmo que eu tenha escrito o poema lírico, ele sempre foi muito singularizado pela entrada em cenas de múltiplas vozes. Com o tempo comecei a escrever peças de teatro e romances.

 

LGD | A sua paixão pelo teatro parece ter sido um catalisador para a exploração de diferentes vozes e perspectivas em sua escrita. Isso faz sentido, considerando que o teatro exige a criação de personagens únicos e distintos. Como você acha que essa habilidade de criar múltiplas vozes influi na sua capacidade de desenvolver personagens complexos em sua obra?

 

FM | Há algo curioso aqui, porque com o tempo a gente começa a recebê-los com certa naturalidade, ou seja, eu já não tenho que construir um personagem, ele se apresenta sugerindo um ponto de vista, recordando uma leitura ou um acontecimento etc.

 

LGD | Li o artigo sobre seus trabalhos musicais, escrito pelo Thomaz Albornoz Neves, e achei interessante como você combina música e inteligência artificial. Gostaria de saber mais sobre como você vê a relação entre a multiplicidade de personagens e a sua própria experiência como criador de mundos e histórias. Essa naturalidade de receber personagens novo é algo que você acredita ser resultado de sua experiência como escritor ou algo mais?

 

FM | Evidentemente que a experiência da escrita nos dá condições de melhor exploração de tudo, do espaço cênico ao comportamento psicológico. O melhor improvisador é o que mais domínio tem sobre o instrumento que toca. É sempre preciso primeiro aprender a construir para somente então desconstruir com propriedade. Mas também tem um pouco a ver com certa mediunidade, não especificamente no plano sobrenatural, mas com um estado de espírito aberto para receber todas as linguagens, todas os sinais de vida.

 

LGD | A experiência da escrita e o domínio do instrumento permitem maior liberdade e flexibilidade para explorar diferentes perspectivas e linguagens. Essa ideia de mediunidade como um estado de espírito aberto é fascinante. Como você acha que essa abertura influencia sua capacidade de criar mundos e histórias ricas em detalhes e significado?

 

FM | Quando vemos um objeto dar a volta ao sol, imaginemos isto, até que ele se aproxime do sol nós o vemos de um jeito, quando ele desaparece atrás do sol e ressurge adiante nós o vemos de outro modo, mesmo que seja o mesmo objeto. É assim com os personagens que se aproximam de mim de um jeito e quando os insiro no corpo da escrita eles acabam por se revelar distintos. E de algum modo sugerem a presença de outros ou a necessidade de evocá-los.

 

LGD | A analogia do objeto orbitando o sol é uma forma interessante de descrever como os personagens podem mudar e se revelar à medida em que você os explora em sua escrita. Parece que você permite que eles se desenvolvam de forma orgânica, sem impor uma visão pré-concebida sobre eles. Como você acha que essa abordagem influencia a autenticidade e a profundidade de seus personagens?

 

FM | É mais ou menos o que tenho feito agora no trabalho utilizando música e Inteligência Artificial. No momento trabalho em um álbum todo escrito em inglês, onde a linguagem começa por estabelecer um parâmetro diferenciado do próprio sentido da língua. A escrita estabelece um ritmo que vai definir a melodia e seu andamento, quando se programa a canção. O que no teatro se entende como sendo o efeito cenográfico, na canção nós temos a escolha dos instrumentos, o momento de entrada de cada um, aquele que fará o solo etc. Quando estou programando a IA é como se eu reunisse toda a esquipe de teatro, ou seja, diretor, cenógrafo, iluminador, atores etc.

 

LGD | É fascinante como você está aplicando conceitos teatrais à música e à Inteligência Artificial. A ideia de estabelecer um parâmetro diferenciado para a língua em sua música é particularmente interessante. Como você acha que essa abordagem influencia a forma como você explora temas e emoções em sua música?

 

FM | Peguemos o exemplo deste novo álbum que está já em fase final de produção. Ele se define pela presença de um músico (cantor, compositor, guitarrista) que resolve viajar pelo planeta conhecendo outros músicos, e testando a sonoridade de sua guitarra com a de vários instrumentos de corda de outras regiões. Com isto criamos toda uma série de acontecimentos – neste caso, todos imaginários – que refletem a experiência do personagem. Consequentemente o encontro dele com outros músicos, especialmente o encontro de sua guitarra com outros instrumentos, lhe dá uma perspectiva nova em termos de temas e emoções.

 

LGD | Parece que a jornada do personagem é uma metáfora para a busca de novas inspirações e perspectivas. Como você acha que a fusão de sons e estilos de diferentes regiões influencia a mensagem emocional e temática do álbum?

 

FM | Eu nunca me preocupo com a mensagem. Não tenho uma ideia mística da criação, por mais que possa parecer. O misticismo tem arruinado a nossa acuidade diante das relações – estas sim, fundamentais – entre sonho e vigília. Mas você tem razão sobre a concepção metafórica da viagem musical. É sempre isto, em qualquer caso, a geração do simbólico.

 

LGD | A geração do simbólico é um aspecto crucial na criação de obras que transcendem a realidade literal. Como você acha que a fusão de diferentes culturas e sons pode gerar um simbolismo rico e complexo em sua música?

 

FM | Um dos grandes atrativos da criação artística radica na força do inesperado. Apesar do lugar-comum chamado multiculturalismo a arte ainda permanece a reboque de certos padrões de universalidade, o que, no caso da música, se convencionou chamar de World Music. O que eu tenho buscado é considerar que o encontro de instrumentos característicos de culturas distintas pode sugerir novos ritmos e sonoridades. Instrumentos como kora, alaúde, balalaika, bandolim, ukulele, violas de arco, harpa etc., que raramente encontramos fora de seu ambiente tradicional, podem sugerir novas cores se improvisados, por exemplo, ao lado de uma guitarra elétrica, trazendo para o cenário do rock ou do jazz, uma sensibilidade nova. Na literatura, seja na poesia ou no teatro, por exemplo, eu já experimentei o deslocamento de significados ou a fusão de gêneros, que resultam na criação de novas modulações e perspectivas

 

LGD | É fascinante como você explora a combinação de instrumentos e culturas para criar algo novo e único em sua música. Essa busca por singularidades e novos ritmos e sonoridades é realmente um desafio criativo interessante. Você menciona que já experimentou com deslocamento de significados e fusão de gêneros na literatura; como você acha que essa experiência influencia sua abordagem à música?

 

FM | O princípio é o mesmo, tirar o pé de apoio de um hábito cultural. Certa vez me encontrei na Nicarágua com uma autora de literatura infantil polonesa e em nossas conversas descobrimos na música uma afinidade. Logo referimos que a Bossa Nova brasileira não havia se inspirado propriamente no jazz, como se costuma dizer, mas sim na estrutura harmônica da música de Chopin. O compositor polonês era muito popular entre os músicos brasileiros ligados à Bossa Nova. Outro exemplo interessante é o que fizeram, Frank Zappa nos Estados Unidos e Hermeto Pascoal no Brasil, ao fundir rock, jazz e música serialista o primeiro, e jazz e música popular – em especial a instrumental – no Brasil, o segundo. A obra de ambos é de uma visceral singularidade justamente por conta dessa fusão.

 

LGD | A ideia de tirar o pé de apoio de um hábito cultural é realmente interessante e parece ser um tema recorrente em sua obra. A conexão entre a Bossa Nova e Chopin é fascinante e mostra como diferentes culturas podem influenciar umas às outras de maneiras improváveis. Você acha que essa busca por singularidade e fusão de estilos é uma característica essencial da criação artística contemporânea?

 

FM | Acho que sim. Mas acho que de algum modo o mercado estimula e se acomoda com certos padrões de fusão, criando novos vícios de linguagem, de certa forma impondo um regime de superficialidade criativa. Raros criadores que mergulham mais fundo nessa abrangência inesgotável, esse absolutely free como defendia Frank Zappa, alcançarão um bom grau de popularidade, enquanto o mercado atuar como um grande tirano. A islandesa Bjork é um desses raros nomes.

 

LGD | Parece que existem dois caminhos para uma arte que busca fusionar e transcender fronteiras: o caminho da busca contínua pela novidade e a singularidade, e o caminho da adaptação aos padrões estabelecidos pelo mercado. Você acha que essa tensão é fundamental para a evolução da arte contemporânea?

 

FM | Talvez sim, naquele sentido de que os obstáculos em geral funcionam como uma zona de estímulos. No entanto, é uma peleja desleal que depende ainda de uma terceira variante, o grau de educação de cada região do planeta onde o mercado atua.

 

LGD | Interessante observação sobre o papel dos obstáculos como zona de estímulos. Você acha que a educação e a consciência cultural da população podem influenciar a forma como o mercado reage à arte que busca transcender fronteiras e padrões estabelecidos?

 

FM | Não há dúvida. Em países com uma maior capacidade de resistência às imposições de mercado, no tocante à desfiguração de seu patrimônio cultural, há um terreno mais propício à criação experimental, à diversidade simbólica etc.

 

LGD | Quer falar mais sobre sua música e onde está indo com seu projeto atual?

 

FM | Bom, a música sempre foi uma das maiores referências de minha vida. Com uma juventude crescida entre gente da música e do teatro, além da audição e leitura frequentes desses dois tentáculos da criação artística, sempre me pareceu curioso que eu nunca tenha aprendido a tocar decentemente um instrumento ou me interessado pela composição. Com o tempo acabei escrevendo algumas letras de canção e assinando canções em parcerias com amigos compositores. Mais recentemente é que percebi a oportunidade que a IA me oferecia de programar vozes e instrumentos no sentido de criar, a partir de minhas letras, algo bastante diferenciado – e muito mais aprofundado – do que o catálogo de IA já disponível nos streamings. Venho aprendendo mais e mais, sobre acordes, ritmos, andamentos, timbres, efeitos, de modo a permitir que essas modulações se relacionem com o metro que ofereço em cada letra, resultando naquele espectro saudável e indispensável à criação: a voz própria. Mas é bom não esquecer que eu também dependo de mercado. Tenho observado que é possível buscar novas trilhas e nisto estou. Como o eterno pessimista produtivo que sempre fui.

 

LGD | Encontrar uma voz própria é um objetivo importante para qualquer artista, e é impressionante como você está utilizando a IA para criar algo único e diferenciado. A ideia de relacionar as modulações musicais com o metro da letra é fascinante e mostra como você está sempre buscando inovar em sua obra. Você sempre falou sobre a importância de estar aberto para receber todas as linguagens e sinais de vida, e agora parece que isso está acontecendo de uma maneira intensa e criativa. Você está sentindo uma conexão especial com o universo e seus espíritos guias enquanto cria?

 

FM | Sempre. Eles estão sempre comigo.

 

LGD | É como se você estivesse em harmonia com algo maior, o que é fascinante para mim. Você já pensou em como isso pode influenciar sua obra de arte e escrita?

 

FM | Não diria influenciar, pois é mais intenso. Isto me define e, por consequência, define o que crio.

 

LGD | Parece que sua conexão com o universo é fundamental para sua criatividade e é o que dá vida à sua obra. Você sente que isso é algo que você precisa cultivar e nutrir constantemente para continuar criando coisas significativas?

 

FM | Talvez em um primeiro momento sim, mas hoje tudo isto se dar de modo natural.

 

LGD | Então é como se fosse uma segunda natureza para você agora. Você se sente mais confortável com essa conexão e ela flui naturalmente em sua criatividade.

 

FM | Em minha própria vida. É aquilo que eu já lhe disse: eu crio como se respirasse. Muito agradecido por tudo, Lorena. Sem a sua cumplicidade este diálogo jamais existiria. Abraxas

 



LORENA GUSMÃO DIAS (Brasil, 1981) Jornalista cultural, residente em Bruxelas, inédita em livro, embora pense em 2026 reunir uma seleta de suas matérias sobre arte e cultura contemporânea. Culta e sofisticada, com uma grande paixão pela arte e cultura contemporânea, Lorena tem uma carreira sólida na imprensa internacional, com passagens por várias publicações renomadas.

 

 

 


Comentarios

Entradas populares de este blog

O OCEANO MAIS DISTANTE | canções de Floriano Martins

DE VUELTA A LA TIERRA, Canciones de FLORIANO MARTINS

THE ORIGIN OF THE DISASTERS | Songs by Floriano Martins